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23 agosto 2024

A Bíblia do Adultério


Análise da Tradução Inusitada
A chamada “Bíblia do Adultério” é um exemplo clássico de como um erro mínimo pode alterar drasticamente o significado de um texto sagrado. Publicada em 1631, essa edição da Bíblia King James se destacou por uma omissão gravíssima: no sétimo mandamento, a palavra “not” (não) foi deixada de fora, fazendo com que o mandamento fosse impresso como “Thou shalt commit adultery” (“Tu cometerás adultério”) em vez de “Thou shalt not commit adultery” (“Tu não cometerás adultério”). Embora tecnicamente não se trate de um erro de tradução, e sim de uma falha tipográfica, a gravidade do equívoco lhe conferiu status simbólico. A tradução inusitada inverteu por completo o sentido moral do texto, transformando um dos mandamentos fundamentais do cristianismo em sua exata negação, causando enorme escândalo.

Contexto histórico
A impressão dessa Bíblia ocorreu na Inglaterra do século XVII, sob o reinado de Carlos I. A Inglaterra era um país profundamente cristão, protestante, onde a Bíblia havia sido recentemente traduzida para o inglês no reinado de Jaime I, com a publicação da King James Version em 1611. A versão autorizada era protegida por direitos de impressão concedidos pela Coroa. Robert Barker e Martin Lucas, os impressores reais da época, eram os responsáveis por sua publicação. O trabalho de impressão era feito de forma manual e árdua, com tipos móveis de chumbo organizados letra por letra. Em um ambiente sem revisão ortográfica automatizada, erros de composição eram relativamente comuns, mas raramente em pontos tão cruciais. Essa edição de 1631 pretendia ser uma nova impressão da Bíblia autorizada, mas entrou para a história como uma das mais notórias já feitas.

Origem do Nome
O nome “Bíblia do Adultério” (em inglês, “Adulterous Bible” ou “Wicked Bible”) surgiu por causa do erro que ordenava, de forma literal, a prática do adultério. Com isso, ela também passou a ser conhecida como a “Bíblia Maldita”. O adjetivo “maldita” se refere tanto à heresia implícita no erro quanto à condenação oficial feita pelas autoridades religiosas e civis. Houve quem associasse o incidente à figura demoníaca de Titivillus, um demônio medieval acreditado por monges como responsável por erros em cópias manuscritas de textos sagrados. Assim, a Bíblia foi amaldiçoada não só simbolicamente, mas também espiritualmente e politicamente, tornando-se um exemplo sombrio da vulnerabilidade dos textos religiosos às falhas humanas.

O Erro de Tradução
Apesar de ser frequentemente referido como um erro de tradução, o problema está mais precisamente em uma omissão tipográfica. A palavra “not” (não) foi omitida por acidente ou descuido durante a composição tipográfica do texto em Êxodo 20:14. O resultado foi uma inversão total do mandamento, algo inaceitável dentro de qualquer tradição cristã. Não há indícios de que o erro tenha sido proposital, mas sua gravidade levantou suspeitas na época. Como o restante da Bíblia mantinha a tradução padrão da versão King James, é claro que o erro foi isolado, embora de consequências devastadoras.

A reação da igreja e autoridades da época
A reação foi imediata e severa. Ao ser informado do erro, o rei Carlos I ordenou que os responsáveis fossem levados à Star Chamber, tribunal da época. Os editores Robert Barker e Martin Lucas foram julgados e severamente punidos: receberam uma multa de 300 libras, valor extremamente alto para a época, e perderam o direito de imprimir a Bíblia. Além disso, todas as cópias conhecidas foram recolhidas e destruídas, num esforço de apagar o escândalo. A Igreja Anglicana, em especial sob a liderança do Arcebispo de Canterbury George Abbot, ficou profundamente escandalizada, considerando o erro como uma ameaça à moral pública e um desrespeito às Escrituras. A resposta oficial foi rigorosa, refletindo o quanto o texto bíblico era considerado inviolável e sagrado.

Impacto e Repercussão
O impacto foi grande tanto no meio religioso quanto no público em geral. A Bíblia do Adultério se tornou símbolo de erro e heresia. A reputação dos editores foi arruinada, e sua falência logo se seguiu. As cópias restantes, inicialmente perseguidas e destruídas, passaram com o tempo a ser vistas como curiosidades raras e valiosas. Hoje, restam menos de 20 exemplares em coleções privadas e bibliotecas como a British Library. A repercussão ao longo dos séculos transformou essa edição em item de estudo acadêmico e objeto de desejo de colecionadores. Ela também reforçou a importância de revisão e controle na publicação de textos sagrados, influenciando futuras práticas editoriais e religiosas.

Significado Histórico e Cultural
Historicamente, a Bíblia do Adultério serve como um símbolo poderoso dos perigos da falibilidade humana em assuntos considerados divinos. Culturalmente, tornou-se um lembrete quase literário de que um único erro de digitação pode inverter uma doutrina inteira. Também ilustra a tensão entre o sagrado e o técnico, entre o divino e a materialidade dos livros impressos. A superstição em torno do erro e sua associação com forças demoníacas mostra o quanto, no imaginário da época, a cópia fiel das Escrituras era vista como tarefa quase espiritual. A Bíblia do Adultério acabou entrando para a cultura popular, sendo referenciada em artigos, documentários, exposições e até leilões.

Conclusão
A Bíblia do Adultério representa um momento emblemático na história da impressão e da religião. Embora derivado de um erro aparentemente banal, sua repercussão foi imensa. O caso revela não apenas a fragilidade dos processos humanos, mas também a força simbólica dos textos religiosos e o rigor com que eram tratados. O episódio serviu de alerta para as futuras gerações de impressores e tradutores, e ao mesmo tempo, conferiu àquela edição uma aura de curiosidade histórica. Hoje, mais do que um escândalo, ela é um testemunho raro da interação entre fé, tecnologia e erro humano.

Referências
British Library Archives – Exemplares sobreviventes da "Wicked Bible"
Cambridge University Press – Histórias das traduções e edições da Bíblia
National Archives UK – Documentos da Star Chamber e julgamento de 1631
The Guardian (2015) – Artigo sobre leilão de exemplar da Bíblia do Adultério
Museum of the Bible – Exposição sobre edições raras da Bíblia

Fonte imagem:https://aventurasnahistoria.com.br/noticias/reportagem/cometeras-adulterio-o-erro-de-impressao-da-biblia-que-revoltou-corte-da-inglaterra.phtml

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